A participação da extensão universitária no processo de descolonização do pensamento e valorização dos saberes na América Latina - Maria das Dores Pimentel Nogueira
Fichamento de Bruno Alcantara
Última atualização: 20 de setembro de 2024
Preâmbulo
A autora inicia o preâmbulo abordando sua relação profissional com a extensão universitária, na qual atua há trinta anos defendendo sua centralidade como dimensão acadêmica na vida da universidade. Trabalhou tanto em estudos acerca da extensão universitária, como na gestão da extensão da UFMG e coordenação de ações de extensão.
Questões que a intrigavam, acerca da extensão universitária, passaram a tomar forma após entrar em contato com autores do movimento modernidade/colonialidade ao cursar a disciplina Bases Epistemológicas da Investigação Educativa, do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UFMG. A partir daí, tornaram-se mais críticas as suas concepções e diretrizes, bem como suas reflexões sobre as possibilidades e dificuldades no âmbito da extensão universitária.
Outro momento pessoal citado como relevante foi sua participação no Programa Polo de Integração da UFMG no Vale do Jequitinhonha. Este programa regional que articula as ações de extensão, ensino e pesquisa ancora-se em dois referenciais teóricos e metodológicos: a) do ponto de vista do desenvolvimento regional, menciona os trabalhos: Lixo e cidadania uma experiência inovadora no Médio Vale do Jequitinhonha/Minas Gerais; e Vale do Jequitinhonha: desenvolvimento e sustentabilidade; e b) do ponto de vista da própria extensão universitária, menciona o pensamento de Paulo Freire, especialmente as suas diretrizes de Interação Dialógica, Interdisciplinaridade, Articulação ensino/pesquisa/extensão, Impacto na formação do estudante e Impacto e transformação social.
Verificou-se a necessidade de incorporar a população do Vale na condição de promotores, indutores e beneficiários do desenvolvimento econômico, social e humano.
Os saberes locais são valorizados. Seja pelo trabalho com os contadores de história ou pela qualificação dos professores do ensino fundamental e médio para trabalhar com esse material valoriza-se a linguagem regional. No material de ensino há, lado a lado, versões com a linguagem local e padrão, exemplificando a prática extensionista realizada no programa.
Também foi desenvolvido o projeto Visões do Vale, também em um processo de valorização dos saberes locais: seminários anuais com lideranças locais, representantes de universidades e do poder público.
Os extensionistas não somente ensinam, mas aprendem: “conhecer e reconhecer suas epistemes, tais como as valiosas e seculares técnicas de manejo do solo e de conservação da água”. Existe, assim, uma valorização do saber local e a adoção de uma perspectiva na qual é possível valorizar os saberes ancestrais. A relação se estabelece ao: i) indagar quais saberes são esses; e ii) observar a transmissão desse conhecimento às novas gerações.
Introdução
A tese está ancorada em três eixos de argumentação acerca do conceito e a prática da extensão universitária. São eles: a) o reconhecimento da existência de diferentes pressupostos que sustentam a extensão desde a sua criação; b) a percepção, a partir de estudos de Paulo Freire, de que uma extensão pensada unilateralmente (isto é, que somente se preocupa em transmitir conhecimento, sem troca de saberes) gera chances reais de ser usada como um instrumento de colonização, sendo necessário fazer uma leitura crítica das ações extensionistas; e c) a noção de que, ainda no século XXI, diversas estruturas herdadas do colonizador podem ainda estar incrustadas nas ações desenvolvidas pela extensão universitária.
A fim de desenvolver os argumentos, a autora irá: a) reconhecer o papel da extensão universitária no atual momento histórico; e b) realizar novos questionamentos à luz dos estudos pós-coloniais latino-americanos. A pesquisa, vista como ato político, reflete sobre os fenômenos que conhece e as consequências que ajudou a estabelecer.
Para definir seu objeto de pesquisa, a pesquisadora se indagou: a) a extensão contribuiu para a colonização do pensamento latino-americano?; b) como foi utilizada a extensão universitária no processo de colonização?; c) como a extensão foi apropriada por governos ditatoriais ou movimentos de esquerda?; d) em qual contexto histórico passou a se refletir sobre a necessidade de uma extensão anticolonial?; e, o problema central de pesquisa, e) pode a extensão contribuir para a descolonização do pensamento latino-americano e para a valorização dos saberes locais?
A fim de delimitação do objeto de pesquisa, a autora escolheu as extensões da Universidade Federal de Minas Gerais e da Universidad Nacional de Córdoba como amostras relevantes para se compreender a realidade latino-americana.
Os referenciais teóricos que amparam a indagação central da tese são: a) Estudos Pós-Coloniais Latino-Americanos, que estudam a formação do pensamento latino-americano sob a influência colonial européia; e b) estudiosos brasileiros e argentinos sobre a extensão universitária.
A metodologia utilizada é de natureza qualitativa, isto é, apoiada em diversos procedimentos metodológicos, como: a) pesquisa e análise histórico-documental; b) pesquisa histórica bibliográfica; c) entrevistas em profundidade e semi-estruturadas. A pesquisa de campo em Córdoba, a fim de compreender a Reforma de Córdoba de 1918 e a regulamentação da extensão na Universidad de Córdoba, foi realizada entre maio e junho de 2017 e, após, no mês de junho de 2018.
A tese está estruturada em oito capítulos. Em ordem, eles se referem à (ao): i) introdução; ii) referenciais teóricos que orientam a análise; iii) percurso metodológico para a realização da pesquisa; iv) relevância da Reforma de Córdoba; v) estudo de documentos produzidos após a Reforma de Córdoba por representantes de universidades da América Latina; vi) resultado das pesquisas sobre a extensão universitária na Argentina; vii) resultado das pesquisas sobre a extensão no Brasil; e viii) apresentação das considerações finais.
Fundamentação teórica
Segundo Mirra, as primeiras extensões na América Latina se espelharam na experiência inglesa de Oxford e Cambridge seguindo um modelo que propunha levar a universidade aos que não podiam acessá-la. Era comum ser realizada através de cursos e conferências ministradas à classe operária.
Nogueira sustenta que, ainda que houvesse um real compromisso dos estudantes com as classes trabalhadoras, tal modelo de extensão pode ser considerado elitista, com viés dominador: “quem sabe ensina pra quem não sabe”.
Foi com o movimento que deu origem à Reforma de Córdoba que a extensão universitária perdeu essa primeira característica, ainda que não completamente.
A Construção Teórica e Política da Extensão Universitária na América Latina
No Brasil, somente após as reflexões de Paulo Freire que a extensão deixou de ter um caráter elitista de mera divulgação das pesquisas científicas e realização de cursos para camadas mais abastadas. Dois marcos em sua trajetória são sublinhados: i) o programa de alfabetização de adultos, à frente do Departamento de Extensão na Universidade do Recife; e ii) o lançamento do seu livro “Extensão ou Comunicação?” no final da década de 1960, além de outras obras importantes.
Paulo Freire, na obra mencionada, critica o uso do termo “extensão”, na medida em que estender algo a alguém dá a ideia de que quem recebe está em uma posição de inferioridade. Essa ideia traz como premissa a valorização de um saber em detrimento do outro, isto é, hierarquizando saberes, com o saber universitário acima do saber local. Além disso, a ideia de estender, segundo Freire, remete à invasão a um espaço histórico-cultural para imposição de valores.
O educador sustenta que aqueles que defendem a libertação do ser humano precisam abdicar das relações construídas em estruturas verticais e rígidas nas quais há posições de superioridade e inferioridade. Para isso, não podem ser antidialógicos, isto é, precisam permitir a existência de um ambiente participativo.
Foi com suas experiências junto aos extensionistas rurais do Chile que Freire encaminha suas reflexões na educação para a extensão. Propôs que educação, operada pela via da dialogicidade, se torna diálogo, que se torna comunicação, isto é, precisa ocorrer “no tempo e no espaço, entre homens, uns com os outros, mediatizados pelo mundo, em busca permanente, em sua vocação ontológica de ser mais”.
O termo “extensão” é utilizado até hoje, mas, por influência de Paulo Freire, quem o usa se dedicou a redefini-lo.
Salazar Bondy é outro marco teórico utilizado que questiona o uso do termo “extensão”. O autor aponta a presença de padrões de dominação e subordinação nos sistemas educacionais e na universidade. Segundo afirma, esses padrões dão causa à afetação de zonas íntimas da consciência. Ao mesmo passo, geram a consolidação de uma forma específica de pensar que subordina alguns homens a outros e saberes locais a um conhecimento importado e hegemônico.
Bondy assinala que a prática da extensão era dotada de uma perspectiva verticalista, impositiva e desumanizante. Com ela, a universidade se tornava um dos polos de dominação em um conjunto mais complexo de subordinação e alienação. Diante disso, o teórico aponta fatores a serem considerados na busca por uma perspectiva universitária emancipatória. São eles: a) rever os esquemas organizativos, a fim de aumentar a participação e afastar a relação vertical na qual se funda o autoritarismo; b) estabelecer uma relação educacional espontânea, com base na colaboração e no diálogo; c) abrir a instituição universitária, de maneira que ela se integre a comunidade a que pertence; e d) negar a seleção intelectual, desmascarando as formas de dominação baseadas em padrões sociais classistas.
O Processo de Formação e Colonização do Pensamento Latino-americano sob Influência Europeia
Em diálogo com as teorias pós-coloniais e o movimento de descolonização, surgem nas Américas os Estudos Pós-Coloniais Latino-Americanos. Segundo Silva, os estudiosos da área questionam os sujeitos e o lócus de enunciação, contestam a geopolítica moderna do conhecimento e lutam contra a racialização e racionalização que fundam a herança colonial. Os autores do grupo Modernidad / Colonialidad são citados como principal referência teórica para discutir a formação do pensamento latino-americano sob influência do colonizador.
Com os estudos, a primeira característica do legado epistemológico a ser desvelada é a pretensão de exclusividade, ou superioridade, do pensamento europeu. A ordem social europeia não era apenas a mais desejável, mas a única possível.
Com a invasão européia das Américas, se verificou um processo de racialização, no qual o homem branco-europeu, civilizado, cristão e heterossexual está em uma hiearquia superior aos demais. A própria invasão se legitimou através da imposição dessa hierarquia: a forma de vida do colonizador era válida, enquanto a do nativo não.
Dicotomias surgiram para amparar essa visão dominadora: primitivo e civilizado; erudito e popular; tradicional e moderno; mito e ciência; idiomas e dialetos; cultura e folclore; religião e seita; fé e superstição; entre outras.
Segundo Quijano, não apenas se pensaram superiores, os europeus, mas lograram estabelecer essa forma de pensamento como hegemônica no mundo.
A construção da extensão universitária na América Latina, no Brasil e na Argentina
Neste capítulo, são abordadas as etapas de construção da extensão universitária no Brasil e na Argentina, sem deixar de lado encontros regionais sobre o tema, realizados por toda a América Latina.
O capítulo está dividido em três tópicos. Eles abordam, respectivamente: i) o processo que a extensão universitária passou para formar seus conceitos e diretrizes políticas, através de fóruns coletivos, congressos e conferências; ii) os textos legais que normatizam o ensino superior, em especial no tocante à extensão universitária, no Brasil, analisando os referenciais teóricos e diretrizes construídos pelo Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Instituições Públicas de Educação Superior Brasileiras; iii) os textos legais que normatizam o ensino superior, em especial no tocante à extensão universitária, na Argentina, analisando os referenciais teóricos e diretrizes construídos pela Rede de Extensión Universitaria e pela Comisión de Extensión do Consejo Interuniversitario Nacional.
América Latina: O Processo de Construção das Diretrizes Conceituais e Políticas da Extensão
Em 1921, ocorreu, no México, El Primer Congreso Internacional de Estudiantes, momento em que a extensão foi entendida como uma obrigação dos centros estudantis. O congresso teve tom anticolonial e americanista, rejeitando as tendências imperialistas e de hegemonia, e propondo a criação de uma nova humanidade baseada em solidariedade e justiça. O documento final do congresso, em geral, revela o seu alinhamento aos postulados da Reforma de Córdoba, porém, com ênfase na extensão universitária.
Em 1949, na Guatemala, ocorre El Primer Congreso de Universidades Latinoamericanas, momento de relevância para a institucionalização da extensão nas universidades, visto que se tem a aprovação de resoluções que conceituam a universidade na América Latina, sua ação social e extensão cultural. A partir deste momento, todas as universidades deveriam ter um departamento específico responsável por levar o saber universitário a todos os setores sociais de cada país. No Brasil, com atraso, somente nas décadas de 1970 e 80 que foram criadas as primeiras pró-reitorias de extensão e estruturas similares.
No congresso, foi criada a UDUAL (Unión de Universidades Latinoamericanas) e aprovada a Carta de las Universidades Latinoamericanas. Este documento reafirma o sentimento americanista, propondo eixos norteadores para as universidades no tocante à educação universitária, carreira acadêmica, direitos e deveres de professores e alunos, etc. No tocante à extensão, menciona vagamente uma ideia de “extensão cultural”.
A UDUAL realizou as primeira (Chile, 1957) e segunda (México, 1972) Conferencias Latinoamericanas de Difusión Cultural y Extensión Universitaria, momento chave para a conceituação e institucionalização da extensão na América Latina. Com base nessas conferências, se verificou uma mudança na concepção e prática extensionista das universidades.
Acerca do conceito de extensão, que veio a ser estabelecido na primeira conferência, no Chile, tem-se que a extensão é a missão e função orientadora da universidade contemporânea, portanto, em posição absolutamente central no fazer universitário. Se expande a ideia de “extensão cultural”, para abranger a realização de atividades nas áreas técnicas, das ciências, da filosofia e arte. Metodologicamente, deveria se estabelecer em relação dialógica, pautada na escuta, no conhecimento dos problemas, dados e valores dos grupos sociais através de busca no meio social (e não em teorias importadas).
Na segunda conferência, realizada no México, é criada a tríade fundamental da universidade, “pesquisa, ensino e extensão”, pelo reconhecimento da extrema importância das ações extensionistas. Neste sentido, debateu-se, novamente, a questão da institucionalização da extensão e a sua integração à dimensão formativa para os estudantes universitários. Se discute a falta de planejamento e avaliação das atividades no presente estado, bem como sua desvinculação aos movimentos sociais, sindicatos obreiros, campesinos e juvenis. A questão de expandir a “extensão cultural” para um aspecto de difusão da ciência e da técnica também retornou.
Os objetivos estabelecidos na segunda conferência foram: a) contribuir para que os setores sociais considerassem o quadro histórico e cultural do processo de emancipação da América Latina em sua visão de homem e mundo; b) realizar a integração do ensino e da pesquisa por meio de uma visão crítica dos fundamentos da universidade; e c) conscientizar dos estamentos para a criação cultural e a transformação social.
As diretrizes conceituais e políticas estabelecidas na segunda conferência para a extensão foram: a) mantê-la ligada aos processos de superação da dominação interna e externa; b) não transmitir padrões culturais hegemônicos e verticais; e c) ser planejada, dinâmica, sistemática, interdisciplinar, permanente, obrigatória e promotora da integração latino-americana.
Em verdade, a II Conferencia Latinoamericana de Difusión Cultural y Extensión Universitaria, realizada em 1972, no México, “constituiu o marco mais significativo na construção das bases conceituais e diretrizes políticas da extensão universitária no continente”.
Surgem, nas décadas seguintes, entidades regionais responsáveis pela extensão universitária, como a Unión Latinoamericana de Extensión Universitaria (ULEU), em 1999. Sua criação se deu sobre duas bases: i) compartilhamento de dados entre instituições de ensino superior, entes governamentais e não-governamentais, além de empresas; e ii) promoção de intercâmbios de experiências.
Este processo de construção do referencial da extensão é um processo contínuo, que pode ser observado até hoje. Seu principal mecanismo são os fóruns de discussão, como conferências e congressos. Neles, se elaboram os conceitos, as diretrizes políticas e metodológicas da extensão. Os dirigentes das universidades e suas equipes debatem, dialogam e constroem a partir do compartilhamento de experiências locais e, então, retornam para suas universidades a fim de aplicar os encaminhamentos.
Que temáticas os fóruns de extensão mais recentes trazem?
A ULEU promoveu o Congreso Iberoamericano de Extensión Universitaria no Uruguai, Argentina, Equador, Cuba e Nicarágua. Temas antigos apareceram, assim como novos.
O X Congreso, em 2009, no Uruguai, teve como Declaración Final o documento de título “Revitalizar la extensión para transformar la universidad. Transformar la universidad para contribuir a la transformación social”, e coloca a extensão no centro da busca pela transformação do modelo universitário profissionalista, que se baseia em formar profissionais aliados à lógica do sistema. A declaração final também garante espaço para organizações sociais e populares nos congressos vindouros, representando um avanço em pautas que já haviam sido ventiladas em outros congressos. O congresso também assumiu a pauta política de democratização radical do acesso ao ensino superior, entendendo-o como um bem público a ser garantido pelo Estado para toda a população. Além disso, reafirmou a importância da curricularização da extensão e a sua importância para os processos de ensino e pesquisa.
A “Declaración de Santa Fé” foi o documento originado do XI Congreso, realizado em 2011, na Argentina. Algumas concepções aprovadas apenas reiteram outras pautas já debatidas anteriormente, como a ideia da extensão estar ligada às necessidades sociais, tendo legitimidade para elaborar e implementar políticas públicas contemporâneas. Além disso, apresenta recomendações metodológicas a fim de melhor aproveitamento dos recursos e incremento do seu impacto.
A Declaração do XIII Congreso, realizado em Havana, em 2015, entre outras pautas, aborda a necessidade de se estar atento às novas formas de colonização impostas por meio da globalização e afirma a importância de elaborar alternativas que protejam os povos locais.
Além dos congressos da ULEU, outras instâncias têm se proposto a pensar a extensão universitária no continente. Por exemplo, a III Convención de Educación Superior, ocorrida em Cuba no ano de 2002 e as Conferencias Regionales de la Educación Superior en América Latina y el Caribe, promovidas pela UNESCO.
A primeira conferência realizada pela UNESCO, também em Cuba, no ano de 1996, teve a presença de representantes de 26 países do continente. O encontro foi caracterizado pela retomada dos princípios do movimento reformista de Córdoba, defendendo “a autonomia, a liberdade de cátedra, o papel da extensão universitária e da pesquisa na solução dos graves problemas sociais dos países da região, o papel da universidade no desenvolvimento das nações e a integração regional”. Em seu documento final, as recomendações incluem: a) ser, a extensão, parte importante da atividade universitária; b) promover o Servicio Civil Universitario; c) assumir a tarefa de preservar e fortalecer a identidade cultural da região; e d) promover a integração regional gerando a consciência de pertencimento à comunidade de nações da América Latina.
A autora menciona que as recomendações citadas também são recomendações fundamentais dos pensadores do movimento Modernidad / Colonialidad, em especial Lander e Castro-Gómez.
A segunda conferência promovida pela UNESCO, realizada na Colômbia em 2008, retoma a ideia de solidariedade regional a fim de promover a integração das sociedades latino-americana e caribenha. Os temas do diálogo e da troca de saberes aparecem no documento final do encontro. A recomendação é de que a extensão seja a maneira pela qual a universidade vai detectar, conjuntamente com diferentes atores sociais, problemas que os mais vulnerabilizados enfrentam e criar espaços para investigação e ação.
Em 2018, com o centenário do Movimento de Córdoba, a ULEU publicou, em março de 2018, a “Declaración de la Unión Latinoamericana de Extensión Universitaria en conmemoración de los 100 años de la gesta y el Manifiesto estudiantil de Córdoba”. A declaração reafirma a importância da extensão para aquele momento e o seu papel na transformação das universidades do continente, colocando-as a serviço do povo. Além disso, considerando os perigos da globalização, se refere à extensão como uma extensão preocupada com o diálogo, a preservação dos saberes locais e buscando agir participativamente.
Em geral, no processo em que se formaram os conceitos e diretrizes políticas da extensão universitária, através de fóruns coletivos, congressos e conferências, tem-se como fio condutor as ideias de “resgate dos saberes populares, na defesa da cultura, da identidade e diversidade dos povos latino-americanos, no reconhecimento e valorização dos saberes ancestrais e no conhecimento e respeito pela história e pelas tradições”. Mais recentemente, se vê um alerta acerca das novas formas de colonização trazidas pela globalização, bem como a orientação freiriana de prevalência do diálogo e troca de saberes. A proposta dos reformistas de 1918 deu os princípios básicos da solidariedade e da justiça social, não deixando de ser atualizada e ampliada ao longo do século.
O Processo de Institucionalização e Construção das Diretrizes Conceituais e Políticas da Extensão Universitária no Brasil
A primeira referência à extensão universitária na legislação brasileira data de 1931. Foram três decretos que compuseram a Reforma do Ensino Superior da República. São eles: i) Decreto que cria o Conselho Nacional de Educação; ii) Decreto que cria o Estatuto das Universidades Brasileiras; e iii) Decreto que dispõe sobre a organização da Universidade do Rio de Janeiro. Este foi o primeiro passo para a institucionalização da extensão universitária no Brasil.
A sua materialização, como dispõe o segundo decreto, seria através de cursos e conferências. A autora menciona que nem todos os elementos presentes nas propostas dos estudantes de Córdoba estavam presentes na lei, destacando que a ideia de contribuição na solução de problemas dos meios sociais era uma das poucas ideias refletidas nas primeiras normativas. Ainda era a universidade na sustentação de um pensamento hegemônico em sufocamento aos saberes locais.
Em 1961 temos a segunda rodada de legislações acerca da extensão, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Há, contudo, apenas uma vaga e inexpressiva referência à extensão, o que Nogueira entende como um retrocesso.
Enquanto isso, porém, através das práticas e reflexões dos estudantes, organizados na União Nacional dos Estudantes (UNE), “ocorre um dos mais significativos movimentos que transformarão o entendimento que se tinha da extensão universitária e sua prática” no Brasil. O que se via era uma atuação de cunho político ideológico determinado a conscientizar as camadas populares de seus direitos, além da realização de campanhas de alfabetização de adultos, cursos para líderes sindicais, propostas de assistência jurídica, entre outras ações. Nesse cenário, ainda que a UNE só tenha se estruturado metodologicamente nos anos 80, já ensaiavam práticas interdisciplinares, com avaliações das ações realizadas, integrando ensino e extensão por meio de estágios curriculares.
A UNE reúne estudantes de todo o Brasil para discutir e elaborar as primeiras propostas à reforma universitária brasileira, nos anos 60, nos Seminários Nacionais de Reforma Universitária. Destes encontros, por conta da numerosa participação dos estudantes, observou-se uma grande repercussão no movimento estudantil, influenciando a legislação de reforma do ensino superior e as ações de extensão.
Os temas centrais dos Seminários Nacionais de Reforma Universitária foram: a) a realidade brasileira; b) o colonialismo; c) a universidade no Brasil; d) a Reforma Universitária; e e) a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961. Os documentos finais dos encontros são críticos à realidade universitária brasileira, na medida que a entendem como resultado de transplantação cultural europeia e, posteriormente, estadunidense, reproduzindo o estado de subordinação ao qual o próprio país estava inserido. Para os estudantes, a universidade servia apenas para as classes dominantes e não possuíam compromisso regional, isto é, não serviam aos interesses do país.
Conforme se extrai da Declaração da Bahia, documento final do primeiro Seminário Nacional realizado pela UNE, a tarefa revolucionária deveria ser atribuída aos próprios estudantes, mas não sozinhos, e sim como ponto de início, devendo alcançar os operários e camponeses. Isto se dá ao exemplo do pensamento dos estudantes reformistas de Córdoba.
No tocante à Carta do Paraná, documento final do segundo seminário da UNE, compreende-se a reforma universitária como parte de um processo mais amplo das reformas de base, isto é, mudanças na estrutura do país. Ademais, o documento critica as tentativas de rotular como movimentos de agitação a integração entre estudantes e operários e camponeses. A ideia é promover a universidade brasileira como front das reivindicações populares, pretendendo alcançar o poder público e os movimentos de massa.
As críticas administrativas e pedagógicas à universidade brasileira estão alinhadas ao que se viu no Movimento de Córdoba, isto é, propõem autonomia didática, administrativa e financeira, a participação estudantil em um cogoverno universitário e a implementação de um sistema de assistência estudantil. Defendem pautas mais contemporâneas como a implementação de departamentos universitários e regime de tempo integral para docentes e discentes, bem como a flexibilização dos currículos. Suas diretrizes políticas, constam o anticolonialismo e o anti-imperialismo, repúdio às ditaduras e a promoção da autodeterminação dos povos.
Como a extensão universitária aparece nos documentos da UNE?
Na Declaração da Bahia, não é denominada a extensão, mas ela aparece em descrições historicamente associadas às práticas extensionistas. As recomendações incluem: a) abrir a universidade para as camadas populares a partir de cursos para operários e alfabetização de adultos; b) colocar a universidade à serviço do poder público para realizar pesquisas e projetos de interesses dos municípios; c) colocar a universidade, sem pretensão paternalista, à serviço das classes mais desfavorecidas com assistência médica, odontológica, judiciária e técnica.
Já na Carta do Paraná, o termo extensão aparece como via para a democratização da cultura e conscientização das classes populares, preparando-os para os movimentos de emancipação necessários. Para Nogueira, já aí se verifica a influência freiriana, no sentido de que a extensão “não é cultura popular para a massa, mas sim, com a massa”.
Ainda assim, a autora sugere que uma das propostas da UNE ainda tem uma visão reducionista da extensão universitária, ao colocá-la como cursos abertos ao povo. Outra proposta, a de levar cultura ao povo, levantando o seu nível cultural, ainda traz uma visão elitista do papel universitário.
O Processo de Institucionalização e Construção das Diretrizes da Extensão Universitária a partir de 1968
A Reforma Universitária de 1968 é composta por três medidas legislativas. São elas: i) Decreto-lei n. 53, de 1966; ii) Decreto-lei n. 252, de 1967; e iii) Lei Básica da Reforma Universitária, de 1968.
A legislação de 1968 não incorporou avanços da prática do movimento estudantil, reduzindo a extensão a cursos e serviços, enquanto estabelece a unidade entre as funções de ensino e pesquisa. Além disso, há um grande retrocesso ao estabelecer a extensão de maneira desvinculada de planejamento institucional, retirando sua natureza acadêmica e a sua articulação com a pesquisa e o ensino.
Um avanço só pôde ser notado a partir de 1975, com a atuação da Coordenação de Atividades de Extensão (Codae), vinculada ao Departamento de Assuntos Universitários (DAU / MEC), ao elaborar o Plano de Trabalho de Extensão Universitária, o qual Nogueira considera a primeira política brasileira na área.
O documento é influenciado pelas ideias de Paulo Freire e avança ao definir as formas pelas quais se faz extensão, seja por “cursos, serviços, difusão de resultados de pesquisa, projetos de ação comunitária, de difusão cultural ou outras formas de atuação em função de necessidades apresentadas à universidade”.
A criação do Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras, em 1987, foi um grande avanço no campo da extensão no Brasil, estruturado em um movimento de articulação de nível nacional. Socialmente, este foi um período em que se viu a queda da ditadura militar, com grande participação civil nas conquistas democráticas e o fortalecimento de sindicatos e movimentos sociais. A UNE tem sua legalidade restabelecida em 1985, são criadas associações de servidores técnico-administrativos e a de docentes. Tudo isso possibilitou a reflexão sobre o papel da universidade pública brasileira e a retomada de temas fundantes do movimento reformista de Córdoba de 1918.
Nesse contexto histórico, vemos alguns temas se tornando consenso entre os professores dirigentes da extensão nas universidades. São eles: a) o compromisso social da universidade, sendo a extensão o principal instrumento para atingir as camadas mais fragilizadas; b) a necessidade de institucionalizar a extensão; c) o tripé universitário do ensino, pesquisa e extensão; d) interdisciplinaridade da extensão; e e) a responsabilidade governamental de financiar a extensão sem comprometer a autonomia universitária.
Em 1988, um grande avanço na institucionalização da extensão ocorre no âmbito nacional: a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, que, em seu Artigo 207 consagra a indissociabilidade entre as atividades universitárias: “as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Ademais, no Artigo 213: “as atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do poder público”.
Nos anos que seguiram, o Fórum de Pró-Reitores de Extensão elabora três políticas de extensão universitária. São elas: i) Programa de Fomento à Extensão Universitária, em 1993; ii) Plano Nacional de Extensão Universitária, em 1999; e iii) Política Nacional de Extensão Universitária, em 2012.
No texto desses documentos, temos a definição do conceito de extensão como uma troca de saberes acadêmico e popular. A ideia é a de que, pela extensão, o conhecimento acadêmico, confrontado com a realidade, poderá ser testado e reelaborado. Assim, o aprendizado dos universitários no contato com o saber popular acrescenta às reflexões teóricas realizadas no âmbito acadêmico, evidenciando a troca de saberes.
Nesses documentos também se definiram as diretrizes políticas da extensão, que assumiu um foco em ações de extensão emancipatórias, contribuindo para a autonomia das comunidades, que passam a ser entendidas como sujeitos do processo educativo, e não mais como objetos receptores do saber hegemônico. O caráter inter e transdisciplinar também surge como norte das ações de extensão, na medida em que a produção do saber ocorre dentro e fora da sala de aula, no contato com a realidade. Ao mesmo tempo, define-se como princípio o compromisso social da universidade, que deve atuar na superação das formas de exclusão social e marginalização de classes menos favorecidas. Em resumo, as diretrizes são: a) interação dialógica; b) interdisciplinaridade e interprofissionalidade; c) indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; d) impacto na formação do estudante; e e) impacto e transformação social.
Nogueira aponta que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, tem uma visão reducionista da extensão, não avançando muito em comparação com a Reforma do Ensino Superior da República de 1931, “conferindo-lhe a simples atribuição de divulgar os resultados da criação cultural e da pesquisa produzidas na instituição universitária”. Contudo, há um avanço no que se refere à “formação de quadros profissionais de nível superior de extensão”. Além disso, a legislação confere às universidades o estabelecimento das atividades de extensão e a possibilidade de recebimento de bolsas, financiadas pelo poder público, para a sua realização.
Os dois planos nacionais de educação, referentes aos períodos de 2001-2010 e 2014-2024, estabelecem a acreditação curricular das ações de extensão nos currículos de graduação. A partir daí, 10% do total de créditos curriculares, na graduação, devem vir de ações extensionistas (plano 2001-2010) e participação em programas e projetos de extensão (plano 2014-2024).
Em 2008, foi instituído o Programa de Extensão Universitária, também um avanço na institucionalização e financiamento da extensão no Brasil.
O processo de institucionalização e de construção das diretrizes conceituais e políticas da extensão na Argentina
A primeira legislação sobre ensino superior na Argentina data de 1885, a chamada “Ley Avellaneda”. A lei possuía um caráter profissionalista e utilitarista, restringindo-se a formar as bases para os profissionais liberais: advogados, engenheiros e médicos. O texto não aborda a função ou papel das universidades.
A extensão universitária é registrada em 1905, com a sua incorporação ao estatuto da recém-criada Universidad de La Plata. Já neste documento, aparece equiparada às atividades de pesquisa e ensino.
Neste momento, no cenário internacional, a extensão ainda possuía as características de voluntarismo e espontaneísmo. Por iniciativa do idealizador e primeiro presidente da universidade, Joaquín González, contudo, ela já surge na Argentina com caráter legal, institucional e permanente.
González conferiu à extensão, logo, uma grande importância. Para ele, a divulgação dos resultados de pesquisa na universidade poderia gerar maior coesão social, na medida em que elevaria o nível cultural da população pertencente às camadas populares.
Nogueira sugere que a extensão na Universidad de La Plata já nasce com um plano sistemático que superava o modelo colonial europeu, visto que, para além das conferências públicas regulares, realizava atividades como: a) assistência à escolas; b) abertura da instituição para visitas às bibliotecas, museus e laboratórios; c) difusão cultural e educação popular através de uma companhia teatral.
O modelo da Universidad de La Plata se tornou conhecido e veio a influenciar outras universidades.
Para Nogueira, a Reforma de Córdoba também impactou grandemente o estabelecimento da extensão como atividade permanente nas universidades, porém, deixou de contemplar a entrada dos saberes populares na universidade.
Em 1947, é promulgada uma nova legislação sobre o ensino superior argentino definindo quem poderia ministrar os cursos livres e conferências sobre assuntos científicos no âmbito da extensão. Para Nogueira, se comparada ao que havia de ações de extensão na Universidad de La Plata, trata-se de um retrocesso, não avançando em relação à extensão de caráter vertical hegemônico. A legislação é datada do período peronista e também é um retrocesso na comparação com as reformas de 1918, reduzindo a autonomia universitária.
Em 1954, surge uma nova legislação durante o segundo governo peronista, reduzindo ainda mais a autonomia universitária. Por outro lado, nota-se um avanço no que diz respeito à gratuidade dos estudos superiores. Do ponto de vista da extensão, a lei estabelece: a) a missão humanista e de solidariedade social das universidades; b) importância da extensão na difusão cultural; b) a organização das atividades de extensão como atribuição dos conselhos diretivos da universidade; c) a regulamentação e aconselhamento acerca das atividades de extensão como atribuição do Consejo Nacional Universitario, formado por reitores de todas as universidades do país. Tais medidas foram importantes para a institucionalização da extensão, ainda que não haja avanço do ponto de vista conceitual.
Em 1955, instaura-se um novo quadro político na Argentina e surge nova legislação. O decreto lei n. 477 revoga as leis anteriores e restaura a autonomia universitária que o governo Perón havia restringido. A lei restabelece o cogoverno com participação dos docentes, discentes e graduados, os concursos públicos e a liberdade de designação de professores.
No ano seguinte, em 1956, a Universidad de Buenos Aires cria o Departamento de Extensão Universitária que, em 1958, organizou as Jornadas Nacionales de Extensión Universitaria. Ainda em 1958, a Universidad Nacional de Córdoba inclui a extensão em seus estatutos. Segundo Nogueira, tais medidas representaram passos importantes na institucionalização da extensão no país.
Em 1966, o novo governo militar se instala. Os militares acreditam que as universidades são um reduto esquerdista de desintegração social. No ano seguinte, a lei orgânica das universidades nacionais é publicada, fazendo apenas uma mera menção à extensão como uma das atribuições da universidade.
Como no Brasil, porém, a prática extensionista nos anos 1960 ganha força e, com a influência das ideias de Paulo Freire, passa a ser orientada pela relação dialógica entre as universidades e a sociedade.
No início dos anos 70, Buchbinder assinala que os estudantes argentinos estavam engajados em uma ativa política de extensão, realizando ações de construção de moradias populares e estabelecimento de espaços de atendimento jurídico em regiões operárias.
A normalidade democrática é restaurada em 1983, momento em que a população inicia um longo processo de discussão sobre, entre outros temas, as bases da política educativa. Em 1985, então, é criado o Consejo Interuniversitario Nacional (CIN), responsável pela coordenação, consulta e proposta de políticas estratégicas de desenvolvimento universitário para as universidades que livremente a ele aderiram.
Em 1993, a Ley Federal de Educación é promulgada, mas não menciona a extensão, apesar de regular as atividades associadas a ela tradicionalmente, como a difusão do conhecimento, a prestação de serviços e a contribuição para a solução dos problemas locais.
A Ley Nacional de Educación Superior, datada de 1995, se refere à extensão em três capítulos. No primeiro, aborda as funções básicas da universidade, no sentido de estender seus serviços à comunidade, estudando os problemas regionais e contribuindo para a transformação social. No segundo, aborda a autonomia universitária, devendo formular e implementar as práticas de extensão. No terceiro, aborda a importância das instâncias internas de avaliação das atividades de extensão, entre outras, a fim de sugerir medidas de melhoramento.
No geral, a lei de 1995 trata da formalização e da institucionalização da extensão, classificando-a como uma das funções básicas universitárias e como uma das dimensões a serem avaliadas pelo Consejo Interuniversitario Nacional.
Segundo Albrieu, ainda que os estatutos legais coloquem a extensão em posição de paridade com a docência e a pesquisa, a disponibilidade de recursos é reduzida, o que, na prática, atenta contra o seu reconhecimento e hierarquização.
À respeito das diretrizes políticas da extensão na Argentina, remete-se ao ano de 2012 e à reunião dos secretários de extensão das universidades nacionais promovida pela Coordinación General del Área de Extensión Universitaria de la Secretaria de Políticas Universitarias del Ministerio de la Educación. Os pontos abordados incluem: a) diferença na hierarquização em comparação com o ensino e a pesquisa; b) inexistência de financiamento nacional regular para extensão; c) falta de sistematização nacional da extensão e de encontros entre os representantes da extensão.
A partir disso, o Ministerio de la Educación estabelece estratégias. São elas: a) formalização da convocatória dos projetos; b) geração de espaços para intercâmbio de ideias e experiências; c) capacitação para temas específicos; d) financiamento gradual.
Com a participação da Coordinación General del Área de Extensión e das universidades, acontecem os Congresos Nacionales de Extensión e Jornadas Nacionales de Extensión.
Em 2008, o Consejo Interuniversitario Nacional cria a Red Nacional de Extensión Universitaria. Suas finalidades são: a) gerar, promover e difundir as práticas extensionistas nas universidades para fortalecer o seu caráter de comprometimento social; b) promover espaços de reflexão acerca da extensão para formação permanente dos envolvidos; c) propiciar uma política de solidariedade e cooperação entre as universidades para o fortalecimento da extensão; d) promover a integração da extensão com o ensino e pesquisa, bem como a sua inserção curricular, tornando-a institucionalizada e valorizada. Uma de suas atribuições é elaborar e encaminhar ao Consejo Interuniversitario Nacional as propostas de articulação da extensão com outros atores sociais.
O Consejo, por meio de Acordo Plenário, estabelece medidas a serem implementadas nas universidades, a fim de assegurar a hierarquização da extensão. São elas: a) efetivar sua presença nos concursos docentes e avaliações de permanência; b) incluir a extensão nas cargas horárias de professores e alunos; c) tornar a extensão parte da formação do grupo docente e discente; e d) incluir a extensão nos processos de ensino e aprendizagem universitária.
Em 2011, é aprovado o Plano Estratégico da Red Nacional de Extensión Universitaria. Dele, consta a definição de extensão. Suas características são: a) extensão como espaço de cooperação entre a universidade e outros atores sociais; b) propiciar a melhora da qualidade de vida das pessoas; c) estar associada à função social do ensino superior, isto é, a democratização e justiça social e o direito à educação universal; d) através de perspectivas multi e interdisciplinares, a extensão se realiza com ações concretas realizadas junto à organizações sociais ou governamentais; e) devem ocorrer em um contexto dialógico e participativo; f) contribuição à geração e articulação de novos conhecimentos; g) integra as práticas de pesquisa e ensino, contribuindo para a seleção de objetos de pesquisa relevantes para investigação e refletindo nas práticas curriculares.
Para Albrieu, hoje, na maioria das universidades argentinas, a extensão é entendida pela ideia dialógica de troca entre sociedade e universidade.
Algumas considerações
O debate sobre a extensão na América Latina prossegue com algum vigor, visto que ainda se observa a ausência de unicidade na denominação dos órgãos que tratam da extensão no continente.
No Brasil, temos as pró-reitorias; na Argentina, as secretarias. O próprio nome “extensão” não é unânime, e certas universidades vêm o substituindo, seguindo a orientação freiriana.
Existem também diversas funções e atividades ligadas aos órgãos responsáveis pela extensão que não são, propriamente, extensão, como rádios universitárias, museus, teatros, centros culturais, editoras, televisões universitárias, serviços de assistência estudantil. Para Nogueira, isso contribui para uma visão equivocada e distorcida desta dimensão acadêmica.
Por fim, a autora conclui que, apesar disso, os conceitos e diretrizes de extensão no Brasil e na Argentina encontram-se bem assentados a partir do início do século XXI.